quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Equilíbrio dissimulado


Espalhar-me rapidamente na minha imensidão
Como detergente jogado na água
Desaparecer por estar em tudo, em todos...
Eu quero me dissolver em água
Enfraquecer em mim todos estes sabores fortes
Sem perder nada
Ao contrário, ganhar espaço vibrando numa freqüência mais baixa
Cansei de me afundar
Quero só flutuar, espairecer na superfície.
Me esticar por sobre o mar
E assim provar também do céu sem fim
Ter os dois dentro de mim e
Saber que desconheço os seus limites
Ser o motivo dessa tensão horizontica
E ao mesmo tempo ser a harmonia,
O consenso, o permitir, a plasticidade mórfica entre os dois.
Quero ser um tudo
............ e por isso o sou
Não esqueço contudo
Que faço parte desse esquema-moeda
Onde tudo possui um contra-ponto
Um lado oposto
Ao ser tudo, imponho-me a ausência
Do que quer que seja.
Resseco-me então nos ares
E afogo-me em ternas águas...
É isso, encontro-me nesse meio
Nesse equilíbrio dissimulado.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

O menino que sugava as coisas...


Simplesmente deixavam de existir. Quando era criança fez sumir vários brinquedos dos seus companheiros de orfanato. Hoje em dia sabia que não era nada legal fazer sumir as coisas dos outros, mesmo porque as pessoas sempre desconfiavam dele, afinal, era a ultima pessoa a estar com a coisa desaparecida. O fato era que, desde pequeno, todas as coisas a que Mauricio se afeiçoava, um dia, desapareciam. Mas desapareciam da vista das pessoas e não de Mauricio. Ele, de alguma forma, sugava as coisas para dentro de si. Depois que determinado objeto desaparecia passava a ser parte do garoto. Ele conhecia não só a forma, mas o cheiro, o gosto, o porque, a razão de ser, a essência daquele objeto. A partir daquele instante ele nunca mais veria aquilo, já fazia parte dele.

Desde criança observara essa maluquice que acontecia com ele. Logo percebeu que não era igual às outras crianças, que tinham sempre ali, palpáveis as suas bonecas, chupetas, carrinhos de madeira, ursinhos de pelúcia... Mauricio, quando ´´adquiria´´ seu objeto de afeto, não precisava mais da coisa concreta, já a tinha em completude. Aos 10 anos fez sumir a bicicleta de seu único e melhor amigo do orfanato, fazendo com que este brigasse e cortasse a relação com ele para sempre, pois estava certo de que era Mauricio o culpado pelo desaparecimento do seu presente. Isolava-se desde então na biblioteca da escola, procurava sempre os títulos mais interessantes, as figuras mais fantásticas, as teorias mais curvilíneas e, pouco a pouco, ganhava conhecimento, diversão, aventura e uma infinidade de amigos que habitavam, cada um em seu mundo, mas também dentro dele. O menino nunca contara a ninguém a sua ´´mania´´ de fazer desaparecer, mas tinha, no seu íntimo, algumas teorias.

Todas as crianças do orfanato contavam histórias tristes, ou por lembrarem dos acontecimentos ou por terem ouvido alguém lhes contar, sobre como tinham perdidos os pais, os tios, avós. Maurício não. A única coisa que sabia era que, um dia, seus pais sumiram, deixando-o ainda bebê num parque, até que alguém o achou e lhe deu um rumo. O que não entendia era que, se ele, ao gostar muito de uma coisa, a sugava para si e não mais sentia falta de tal, por que já a tinha em sua totalidade, e, se um dia, sugou para si os seus pais, por que é que toda noite, quando as luzes se apagavam, grossas lágrimas corriam-lhe o rosto e uma dor fina no peito lhe gritava vários nomes de homem e de mulher, na esperança que algum deles fossem os nomes de seus pais.

Na dúvida constante que vivia, aprendeu a se controlar e não gostar muito de ninguém, não podia correr o risco de um dia, fazer alguém desaparecer. Se ele tivesse sugado mesmo os seus pais e ainda sim a ausência material destes lhe faziam tanta falta, como poderia perder mais alguém? Mas como todos nós já sabemos, não há formas muito eficazes de mandar no coração e um dia Mauricio se apaixonou...

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Surprise!


É essa pequena abertura que faz de forma irrevogável a conexão entre duas almas. Esse pequeno labirinto negro escondido no ponto mais óbvio dos olhos é o mecanismo Wireless necessário para desencadear todo tipo de descarga hormonal, elétrica, sentimental... é o imã que, direcionado, com intenção ou sem, para um outro imã (quer seja compatível quer não, se é que existe algum que não seja compatível com outro) fizga os dois corpos com um único anzol, lançado no centro da conexão invisível.
Uma vez dentro do labirinto alheio, cabe ao jogador decidir se encara a jornada em direção à obstáculos cada vez mais imprecisos ou se desiste e volta ao portão de entrada.
Por vezes , talvez a maioria, talvez nem tanto, o fator ´´escolha´´ é um mero placebo, concedendo de bom grado aos jovens a ilusão de poder. Um passo dentro, em direção ao centro, e só se volta depois de muitas noites em claro.
É essa pequena abertura. Esse abismo, esse infinito desvirtuador dos conceitos limpos e vistosos. Uma porta para o infinito demiurgo de uma caixinha de surpresas.