terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Homem-boneca

Não havia outro lugar para olhar. Ele só sabia encarar suas mãos entrelaçadas que se apertavam e se esfregavam num sinal claro de nervosismo e desespero. Todo o seu corpo estava estático enquanto na sua cabeça um terremoto acontecia naquele exato momento. Estava de pé na porta de entrada. Ela estava fechada às suas costas e a rua lhe chamando para viver o resto de sua vida... Com muito esforço conseguiu erguer os olhos e olhar as árvores que faziam as vezes de portão, iluminadas por um sol generoso e cruel ao mesmo tempo.

Do outro lado da rua uma garotinha brincava com sua boneca e observou o homem parado, olhando para o nada e se encantou com um brilho repentino que correu dos seus olhos ate a sua camisa. Era engraçado como aquele moço parecia muito com sua boneca nova: paradinho, com as mãozinhas juntas, um olhar congelado num rosto muito branco, quase sem expressão e que, de vez em quando, brilhava, como sua boneca dependendo do ângulo que a segurava no sol...

Dentre tudo o que estava sentindo, o que conseguiu distinguir com mais facilidade foi um vontade enorme de desmoronar ali mesmo. Não existia sentido ir a qualquer lugar que fosse. E desejou com toda a força não ter existido, nunca. Pensou em algumas pessoas que talvez fossem sentir sua falta... pensou um pouco mais e viu que isso logo passaria... não a dor, mas a falta que sentiriam dele. Aí desejou um pouco mais forte.

As bonecas continuaram sendo lançadas de um lado para o outro. Seus nomes sempre gritados. ´´ Menina má, não faça isso...´´ ´´Muito bem filhinha, um pouco mais de chá?´´´´Cuidado senão te esqueço no marcadinho...´´´´ Não vou mais brincar com você,você está de castigo!´´.

O sol continuava ali, mas como se ouvisse os desejos do moço parado à porta, iluminou um pouco mais. As lágrimas agora corriam com mais fluidez... agora não só brilhavam, mas tinham cor. A medida que corriam pelo rosto, pescoço e corpo do homem iam lhe tirando a cor e o dissolvendo. Com pouco tempo suas roupas já estavam molhadas e no chão um pequena possa colorida se formava. Houve um momento e tudo ficou claro, mas como num piscar de olhos voltou ao normal. A garotinha olhou para a porta, onde outrora vira o homem-boneca, pensando que agora o moço estaria fazendo retratos dela e já ia fazendo uma pose para o próximo flash quando percebeu que não havia mais ninguém ali. Olhou para os lados, deu de ombros e ´´Betinha, volte já para a mesa, você ainda não terminou seu café da manhã! Olha lá hein, a mamãe vai ficar muito zangada com você!´´

No chão não havia mais nada a não ser uma pequena gota que ainda cintilava ao sol e que, segundos depois, evaporou e se juntou ao nada.

(Acho que estou começando a voltar... sei que isso não é original, mas a música que ouvia nesse momento é: You Lost me by Christina Aguilera.)

Um outro texto...

Me vêem a mente somente palavras embaralhadas como corvos negros alvoroçados. Há muito gostaria de ordená-las, conduzi-las de uma maneira melhor, mas me faltam forças, me falta aquela antiga chama que mostrava o caminho a seguir, que me dava a palavra mestra. Hoje consigo ver toda a beleza das imagens, mas não consigo descrever sequer os traços mais básicos sem me constranger.

Sinto falta de ler alguns amigos, de olhar-lhes o interior brilhante e me deleitar em suas entranhas. Nesses dias, a única coisa que mais me instiga a um querer, são as músicas mais doces que se poderia achar no Brasil. Marisa e Vanessa são musas que me fazem acreditar ser um artista quando sou nada senão um sonhador dos mais pobres.

E aí eu ouço ´´Deixa o coração ter a mania de insistir em ser feliz...´´ E morro por que mesmo sem deixar, ele me machuca pulsando essa insanidade dentro do meu peito. E me vem uma vontade absurda de escrever, escrever e escrever... mas o que escreveria? Sinceramente não faço a mínima idéia, só sei escrever isso aqui. Escrevo agora só sobre a minha falta de criatividade e minha angustia em não mais conseguir olhar para outra coisa além da minha existência miseravelmente patética, onde nada é presente, só um bocado de passado.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Sobre o amor...

Mesmo que as palavras sejam ditas da forma mais bela, as imagens e os pontos finais sempre serão perfeitos somente nos filmes e nos contos e nos romances. As páginas conseguem suportar com toda firmeza e os atores conseguem evocar vários e vários litros da mais pura vontade de viver o que é uma criação gloriosa. Percebi que a grama sempre será mais verde não no jardim do vizinho, mas nas suas telas de tv, nos seus aparelhos de DVD e nas páginas de suas histórias compradas e fabricadas com todo esmero necessário para que as cores brilhem e irradiem calor.

Não posso mais me perguntar o porque dessas coisas. Não cabe mais discutir com o tempo ou com quem quer que seja a razão de não poder ter no mundo real coisa tão boa. Fato é que elas existem sim no mundo real, mas não estão da forma como gostaríamos que elas estivessem, só isso. Encontram-se escondidas em vários lugares e de formas tão variadas quanto as estrelas que, quando olhamos para o céu, não conseguimos contar ou sequer abarcar como nosso plano de visão tão limitado. Estão dissolvidas em água e vinho. Estão plantadas em jardins, em desertos e em canteiros caseiros. Estão pulsando dentro de cada um de nós num ritmo diferente, ritmos que muitos ignoram por toda a vida... por não precisarem, por não se lembrarem, por não procurarem, por não saberem ouvir, por estarem agitados demais ou por simplesmente acharem que é pouco demais e que não deve ter tanta importância assim.

E é quando, vendo um filme ou lendo palavras bem colocadas, que contam histórias com toda a saturação criativa que conseguimos criar e figurar nessa nossa gloriosa ilha das maravilhas que chamamos de imaginação, que minúsculas gotas se juntam para fazer brilharem os meus olhos e me acelerar o coração. É quando ouço o ritmo que em mim existe, quando penso que, por mais que quisesse ter minhas imagens e meus poemas saturados e expostos em exacerbação, nunca as terei... Me entristeço por que não basta a mim reconhecer o quanto de amor existe em mim, pois reconheço também o quando dele me falta.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

O sol


O sol hoje não sabia que era domingo. Aos poucos, depois de se mostrar belo e brilhante, e disposto ao amarelo e ao claro foi que percebeu. Viu que os carros não enchiam as ruas como de costume. Viu que as pessoas não andavam apressadas como nos outros dias... então começou a mudar.
A mudança aí cada um entenda da sua forma. Isso porque o sol reflete diferente para cada um. É bem como um espelho: eu nunca vou poder ver um galã de novela quando me olho no espelho, só eu mesmo. Ninguém olha para o céu e acha sempre a mesma coisa. Se olhar uma vez e, depois de três segundos, olhar de novo, tudo já terá mudado! A incerteza do que se pode ver, do que se pode encontrar na imensidão azul ou escondido atrás das nuvens, nesses pequenos intervalos entre uma olhada e outra é o que torna a vida mais fascinante; ora pode-se ganhar uma maçanzada na cabeça ora uma cagada de pombo. Nesse ponto também tenho que dizer que vai depender de cada um. Seria alguém obrigado a achar mais interessante uma maçanzada ao invés de uma cagadinha de pombo na cabeça?
Nesse mundo há de se concordar, existe de tudo um pouco ( e em algumas pessoas um pouco muito!). Dessa forma, a ultima coisa que se pode pensar é que as pessoas pensam igual, não é? (Espero que alguém no mundo esteja pensando: Se todos concordarem com esse idiota que ninguém pensa igual não estaremos então, pensando igual?)
O fato é que em muitas, várias, diversas, infinitas (e isso não quer dizer todas, só que são muito grandes) situações não existe o igual, o que existe são níveis de igualdade. Podemos pensar de forma parecida, mas nunca pensaremos igual.
E o sol, o que tem a ver com isso? Sei lá, só acho que, mesmo que ele seja uma coisa concreta e que exista mesmo e lá lá lá, como todas as outras coisas, ele não vai deixar de ser uma simples expressão do que tenho aqui dentro. E hoje eu o vi assim, perdido no tempo, achando que era uma coisa quando era outra. Deve ter se confundido com o calendário de outro planeta. Para mim, nem ele gosta do domingo.

sábado, 3 de outubro de 2009

Chuva



Quando pequeno ainda não sabia direito o que sentia ou pelo quê exatamente sentia. Ia à praia e dali observava o fim infinito do mar que se juntava, lá no horizonte perfeito em sua linearidade, ao céu de uma redondeza assustadora. E sentia que aquela grandeza toda fazia parte dele mesmo, era uma coisa que o pertencia embora não precisasse estar com ele ou dentro dele. E chorava perto da água, como se contribuísse com suas lágrimas para aquilo que era tão...
Hoje estava longe do mar, mudara-se com a família para uma cidade distante e já havia se passado alguns anos. Numa tarde comum, ao voltar da escola, passava pelos mesmos prédios de sempre, todos com sua colorida falta de cor habitual. As pessoas começavam a correr. Era chuva.
Olhando para cima, parou e sentiu aquela brisa que antecede uma boa tempestade. Esperou. Então, quando a chuva começou a lhe banhar, já não conseguia saber o que era seu e o que era do céu. Na verdade, se apropriara das lágrimas da chuva, e essa, de suas gotas. E sentiu saudades...


Na chuva
No chuveiro
É onde elas se multiplicam

É sempre melhor se entregar
Em meio a essas incontáveis gotas

Todas, ao meu redor
Se tornam nossas
Nossa dor e alegria

A rapidez, a fluidez, a quantidade...
A força, a maciez, a dor da saudade...
Toda a intensidade pode se expressar
São minhas, naquele momento
Todas as lágrimas do céu
Todas as que fogem pelos olhinhos do chuveiro
Em mim, ganham sentido!

Expressam os litros que derramo
Dentro de mim.
Expressam a correnteza que passa
As coisas que vão e
As coisas que por algum tempo
Ainda ficam.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Que doce!


E todo domingo parecia começar do mesmo jeito: um sol meio intrometido na janela e uma vontade de ficar um pouco mais. Mas não nesse domingo. Levantou-se com uma vontade de comer qualquer coisa, qualquer coisa mesmo. O apetite veio misturado com o bom humor e uma euforia que não se sabia verdadeira ou sei lá o que.


Na casa só estavam ela e seu pequeno peixinho dourado, na sua laboriosa rotina. Passear entre o pequeno arbusto de plástico e o castelinho de pedra que mobiliavam seu cubículo de vidro. Ela fazia sempre o mesmo. Hoje, seria diferente. Era domingo, por Deus, o que é que se pode fazer num dia de domingo nesta cidade? Nada! Ou melhor, quase... Abriu as portas do guarda-roupas e escolheu a sua roupa mais clara, alguma coisa leve, que fosse alegre também, pra combinar com o seu estado. Vestiu-se enquanto cantarolava uma musica que ouvira num filme que tinha final feliz. Ouviu a musica e não esqueceu mais... e ali estava ela, passeando entre seus lábios quase constantemente sorridentes.


Disse tchau para o peixinho, para as coisas da casa que parecia mais gostosa do que nunca e saiu, fazendo com que as escadas cantassem num ritmo que havia determinado ser o ritmo do seu dia, um samba meio bossa-nova com base num som de brisa do mar. Fechou a portão e, do nada, aquele sol que a tinha despertado deu adeus. Tinha sido apenas a brecha de uma nuvem. Uns pingos gelados começaram a molhar sua camisa branca. Não achou ruim, pensou – Bom, faz algum tempo que não tomo banho de chuva mesmo. A medida que andava os pingos de chuva se tornavam mais freqüentes. Fechava os olhos de vez em quando e sentia o cheiro de terra molhada. Era fraco, o asfalto já tinha tirado quase toda terra de perto, mas ainda dava pra sentir alguma coisa. Se não era o cheiro que ela sentia, era pelo menos a lembrança que ela tinha do que era o cheio de terra molha, e era bom.


Um carro passou por ela e nessa altura algumas possas já tinha se formado. Você já imagina o que aconteceu não? Agora já não dava para ela ir a muitos lugares. Resolveu entrar na próxima rua, era a rua que dava caminho à casa de sua mãe. Estava vazia. Claro, domingo às 9 da manhã, manhã de chuva, não é de se esperar que as pessoas estejam na rua mesmo. Mas as casas estavam todas tão limpas. Era incrível que mesmo a pouca luz que existia nesse dia fazia com que as casas gotejantes fossem tão, tão...simplesmente reflexo do que tinha dentro dela.


Não demorou muito para chegar naquele portãozinho verde, meio enferrujado. Lá dentro um silêncio pouco habitual. Sua mãe era a melhor e mais procurada doceira daquelas regiões. Não tinha tempo ruim para aquela mulher. Sempre trabalhou duro e nunca deixou de fazer sempre a mesma pergunta para qualquer emburrado que chegasse perto dela – Vai um pedacinho de vida para melhorar esse doce? Era assim que sua mãe via seus doces. Pequenos pedaços de vida que serviam para melhorar as coisas. Isso porque ela sabia que nem todo mundo gostava de todo tipo de doce, e mesmo assim, até saber que gosta ou não, a pessoa prova do doce. Prova da vida. Se gosta, procura repetir e as vezes se lambuza, até chega a enjoar de tanto comer... se não gosta, não come mais, a não ser que seja enganado e abocanhe a guloseima.


A mãe fazia questão que a filha tivesse junto dela a chave de sua casa. Assim, Duda entrou correndo na casa da mãe. Correu por correr porque não estava com frio. Mesmo sendo cedo e não tendo o sol para aquecer sua caminhada molhada, estava se sentindo fresca, renovada e aquilo excluía qualquer idéia de frio. A casa estava completamente silenciosa. Só se ouvia o som da água no telhado de plástico transparente que a mãe resolvera colocar ano passado nos fundos da casa, para ficar mais claro. Em cima da mesa da cozinha tinha uma pequeno prato coberto com um pano xadrez. Em cima dele um bilhete:

Estes são especialmente para você minha filha.
São de uma receita nova que inventei.
Não deixei que ninguém provasse antes de você.
Lembre-se: são um pedacinho de vida... espero que eles possam melhorar o doce que é você.

Os olhos brilharam. Sempre dizia – Sou sua maior fã sabia? Se você deixar, vou ter dar prejú para o resto da vida! Levantou o paninho, olhou para os docinhos branco-amarelados em forma de bolinhas e enfiou, de uma só vez, uns três na boca. Tinham um gosto familiar, mas não conseguia se lembrar do que, parecia que já tinha comido algum outro doce com aquele gosto um dia, mas não, não era como esse... esse era meio crocante no começo, tinha uma capinha meio dura mas no fim ia ficando macio, e o seu meio era cremoso, suave. Era curiosos, interessantes, uma delícia!


Correu para o quarto de sua mãe com uns quatro docinhos na mão e mais uns dois na boca. Queria lhe dar um beijo e falar que ela era a melhor doceira do mundo e que queria que aquele doce tivesse o seu nome, já que tinha sido a primeira a experimentar aquela maravilha. Quando chegou perto da porta, andou devagar para não fazer muito barulho. Abriu a porta lentamente e enfiou a cabeça no quarto, como fazia quando era criança. Os olhos arteiros procurando onde a mãe estaria na cama para assim se deitar do lado vazio e lhe beijar a testa. Feito isto, lá estava ela, se enfiando pelo lençol. - Ah mamãe, os doces são deliciosos! Como a senhora consegue hein?


Duda passou a mão pelos cabelos de sua mãe. Depois, escorregou seus dedos pelo seu rosto que estava gelado. Estava gelado. Seus olhos pararam por um segundo no escuro. Sua mão também. Dez segundos depois sua mão já tinha passado pelas narinas e boca confirmando tudo.


Os docinhos, ou melhor, pedacinhos de vida, eram curiosos... jamais seriam provados novamente. Ou pelo fato de não se ter encontrado a receita ou por não se querer mais comê-los.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Uhu!


Alguém gritou na televisão

Ou numa musica qualquer

Que estar apaixonado

É ser escravo, estar sob

Domínio de um tirano

É saber que está preso,

Ver e sentir as correntes

E se deixar, cada dia mais

Prender.

É uma situação bem divertida de ser ver

O preso que se prende ainda mais

Se tornar voluntário da escravidão...



Assim que o grito foi solto lá

Eu soltei outro aqui:

É sim! Uhu!

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

A desculpa é essa:

De vez em quando me pego pensando
Como devo ser chato, enjoado
Repetitivo...
Então como um bom garoto
Que pra tudo tem desculpas
Me valho de tantos outros loucos
Pra justificar minhas palavras rotas

Como disse Elisa
O ´´eutemo´´ tem nova estréia todos os dias
E que a rotina lhe é nada mais nada menos
Que genuíno mote.

Quintana mostra ainda
Que o amor é mais breve que esta nossa existência
E que se é para amar, que se ame baixinho, todos os dias
Constantemente, sossegado, sem pressa...

Eu digo que amo, e amo muito
E digo repetidas vezes, porque não?
Digo pois compreendo o valor que essas palavras tem:
Valor quase invisível.

Porque não é tinta nem som
Não é imagem nem movimento
Que conseguem significar tudo o que esse sentimento é
Tudo o que quer ser transmitido
Tudo de mim que quer saltar e alçar vôo
Se espalhar no espaço, ganhar grandeza
Fazer feliz o alvo dessa seta!

Florbela perdeu a alma
Por sonhar seu amor...
Eu ando perdendo tantas coisas que já nem sei
Pensas que as quero de volta?
Não, nesse meu caso
Estou contente com o tal escambo
Pois se hoje perco as mãos, ganho os teus olhos
Se perco a direção, ganho tua brilhante voz...

A vontade é tanta de te ter
Englobar sua existência, misturar-me a você
Que os valores humanos mais primitivos
Os instintos mais primordiais
Ganham um valor tão secundário
Que certamente muitos os confundiriam com luxo e futilidade.

A desculpa é essa então:
Digo sim, variadas vezes...
Milhões de vezes serão milhões de grãos de areia
Quero te construir uma praia...
Aí, digo mais milhões de vezes, vezes gotas, e lhe faço um mar...
E continuo dizendo quantas vezes for preciso
E quantas vezes me cobrar o agoniado fervor
Te produzo o que me disse que lhe faz falta
O que te faz não querer voltar...
Aí, depois de tudo pronto
Lhe pergunto com um pouco de receio:
Se importa se eu disser mais uma vez ´´euteamo´´ ?

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Pequeno esclarecimento

Os poetas não são azuis nem nada, como pensam alguns supersticiosos, nem sujeitos a ataques súbitos de levitação. O de que eles mais gostam é estar em silêncio - um silêncio que subjaz a quaisquer escapes motorísticos e declamatórios. Um silêncio... Este impoluível silêncio em que escrevo e em que tu me lês.

(Mario Quintana - A vaca e o hipogrifo)

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Moooood...

É assim, vou continuar mudando, sempre sempre... Com gritos e esperneios, sombras de dúvidas, todas azuis, porque um dia um certo alguém disse que certeza é pra quem não ama de verdade. Do que serve a argila dura, imutável? Não, a escultura é viva enquanto está nas mãos do artista, enquanto é trabalhada, esculpida, lapidada e enquanto passa pelos milhões de processos. Quando fica pronta a obra de arte, ela morre. (Não digo que a morte signifique ponto final, mas um outro estado de coisas.) Assim é como devemos ser, não? Esculpidos interminavelmente até morrermos, aí, do jeito que estivermos, terá sido nosso melhor estado, o ultimo. É isso? Sei que tudo pode mudar, até este meu pensamento.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

E aí ta, o primeiro dia do ano!


Ótimo. Primeiro dia do ano. Tem uma certa cara de domingo, um gostinho de sábado... mas sempre esse cheiro de quase, de coisa por vir, de bolo quase pronto pra ser servido. Não há como prever muita coisa no primeiro dia do ano, por isso a maioria das pessoas se enchem de planos com a singela esperança de que pelo menos um deles se realize.
Os planos às vezes se fazem sem que a gente tenha pensado neles. Talvez porque alguns são tão óbvios e necessários que não tem como não fazê-los, então eles se fazem por si só. Outros exigem um bom tempo, uma vontade maior, um tom de comprometimento para que eles se firmem como plano de começo de ano. Algumas pessoas escrevem num papel, pregam num grande quadro no quarto pra ver todo dia, outros deixam na cabeça (onde os coitados logo se perdem), outros falam para os amigos e pedem que esses se lembrem por ele...alguns só deixam que as vontades vinguem e se cumpram. Esse pode ser o meu tipo de planejador esse ano.
Tenho planos, todos parecem estar no nível daqueles óbvios e necessários sabe? Isso não é de formal alguma falta de imaginação ou uma falha de perspectiva com relação ao meu futuro! O fato é que desejo com tanta força tudo que quero que já todos os meus planos são necessidade. Tenho todos em tão alta estima que não penso na possibilidade de não fazê-los se realizarem. O segredo está na categoria em que você coloca seus planos (tá, pode chamar de sonhos também). Se eles estiverem na dos óbvios e necessários sempre se renovarão, confirmando que o que se quer é certo e não há nada que lhe fará desistir de realizá-los, eles se fazem por si mesmos!

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Sing Mallu

(Lembrei de alguém...N)

Nesses dias de chuva ensolarada, trabalhos agoniantes e felicidades originais, um pouco de Mallu Magalhães faz bem:

 Mallu Magalhães - J1

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Equilíbrio dissimulado


Espalhar-me rapidamente na minha imensidão
Como detergente jogado na água
Desaparecer por estar em tudo, em todos...
Eu quero me dissolver em água
Enfraquecer em mim todos estes sabores fortes
Sem perder nada
Ao contrário, ganhar espaço vibrando numa freqüência mais baixa
Cansei de me afundar
Quero só flutuar, espairecer na superfície.
Me esticar por sobre o mar
E assim provar também do céu sem fim
Ter os dois dentro de mim e
Saber que desconheço os seus limites
Ser o motivo dessa tensão horizontica
E ao mesmo tempo ser a harmonia,
O consenso, o permitir, a plasticidade mórfica entre os dois.
Quero ser um tudo
............ e por isso o sou
Não esqueço contudo
Que faço parte desse esquema-moeda
Onde tudo possui um contra-ponto
Um lado oposto
Ao ser tudo, imponho-me a ausência
Do que quer que seja.
Resseco-me então nos ares
E afogo-me em ternas águas...
É isso, encontro-me nesse meio
Nesse equilíbrio dissimulado.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

O menino que sugava as coisas...


Simplesmente deixavam de existir. Quando era criança fez sumir vários brinquedos dos seus companheiros de orfanato. Hoje em dia sabia que não era nada legal fazer sumir as coisas dos outros, mesmo porque as pessoas sempre desconfiavam dele, afinal, era a ultima pessoa a estar com a coisa desaparecida. O fato era que, desde pequeno, todas as coisas a que Mauricio se afeiçoava, um dia, desapareciam. Mas desapareciam da vista das pessoas e não de Mauricio. Ele, de alguma forma, sugava as coisas para dentro de si. Depois que determinado objeto desaparecia passava a ser parte do garoto. Ele conhecia não só a forma, mas o cheiro, o gosto, o porque, a razão de ser, a essência daquele objeto. A partir daquele instante ele nunca mais veria aquilo, já fazia parte dele.

Desde criança observara essa maluquice que acontecia com ele. Logo percebeu que não era igual às outras crianças, que tinham sempre ali, palpáveis as suas bonecas, chupetas, carrinhos de madeira, ursinhos de pelúcia... Mauricio, quando ´´adquiria´´ seu objeto de afeto, não precisava mais da coisa concreta, já a tinha em completude. Aos 10 anos fez sumir a bicicleta de seu único e melhor amigo do orfanato, fazendo com que este brigasse e cortasse a relação com ele para sempre, pois estava certo de que era Mauricio o culpado pelo desaparecimento do seu presente. Isolava-se desde então na biblioteca da escola, procurava sempre os títulos mais interessantes, as figuras mais fantásticas, as teorias mais curvilíneas e, pouco a pouco, ganhava conhecimento, diversão, aventura e uma infinidade de amigos que habitavam, cada um em seu mundo, mas também dentro dele. O menino nunca contara a ninguém a sua ´´mania´´ de fazer desaparecer, mas tinha, no seu íntimo, algumas teorias.

Todas as crianças do orfanato contavam histórias tristes, ou por lembrarem dos acontecimentos ou por terem ouvido alguém lhes contar, sobre como tinham perdidos os pais, os tios, avós. Maurício não. A única coisa que sabia era que, um dia, seus pais sumiram, deixando-o ainda bebê num parque, até que alguém o achou e lhe deu um rumo. O que não entendia era que, se ele, ao gostar muito de uma coisa, a sugava para si e não mais sentia falta de tal, por que já a tinha em sua totalidade, e, se um dia, sugou para si os seus pais, por que é que toda noite, quando as luzes se apagavam, grossas lágrimas corriam-lhe o rosto e uma dor fina no peito lhe gritava vários nomes de homem e de mulher, na esperança que algum deles fossem os nomes de seus pais.

Na dúvida constante que vivia, aprendeu a se controlar e não gostar muito de ninguém, não podia correr o risco de um dia, fazer alguém desaparecer. Se ele tivesse sugado mesmo os seus pais e ainda sim a ausência material destes lhe faziam tanta falta, como poderia perder mais alguém? Mas como todos nós já sabemos, não há formas muito eficazes de mandar no coração e um dia Mauricio se apaixonou...